quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Coluna do Portuga - "Tempo que não volta" (post 1000)

Por André Schmidt

"Lembro-me dos tempos em que eu e meu avô sentávamos na frente de um rádio à pilha para ouvir aos jogos do Vasco. Enquanto isto, minha avó preparava alguns bolinhos de chuva para nos entretermos durante a peleja. São minhas primeiras memórias como torcedor. Pelas caixas daquele velho aparelho, "vi" craques como Bismarck, William, Valdir e Edmundo darem o seu show. Na sala da casa de meu avô, seus olhos brilhavam à cada jogada como se tudo visse, nas arquibancadas do Maraca. Quando não tinha jogo, nossas tardes tinham como fundo musical as notícias do "Panorama Esportivo". A velha camisa - ainda de pano - não deixava o corpo, fosse na pelada no terreno de casa ou nas festas de família.
De manhã cedo, era tradição já. Ao me ouvir descer as escadas de casa para ir à escola, meu avô já abria a sua porta e me entregava a parte de esporte de algum jornal. Entre um comentário e outro - sobre o Vasco, é lógico - nos despedíamos com um saudoso "saudações vascaínas". Passamos à acompanhar pela televisão já quando eu completava 10 anos de idade. Na época, Januário de Oliveira comandava a nossa jornada.Ao gritos de "Cruel, muito cruel!", vibravamos à cada gol cruzmaltino.Meu avô, apesar da descendência alemã, foi criado em Madureira. E, de lá, me trouxe além da paixão pelo Vasco, o amor pelo samba e pela Portela. Suas histórias do passado me fizeram sentir como se também tivesse vivenciado todo aquele tempo.
No meu aniversário de 11 anos, não me foi dado por ele nenhum presente caro, nem dinheiro e nem aquelas roupas, típicos presentes de avôs. Cinco pastas empoeiradas, mofadas e quase rasgando foram os meus presentes. Dentro delas, recortes e jornais inteiros despertavam a minha curiosidade e mexiam ainda mais com a minha paixão. Ainda hoje, me pego lendo aqueles velhos papéis amarelados como se os visse pela primeira vez. Palavras como "goalkepper", "placard", "tento", "crack" e "center-half" desenhavam a história do clube mais apaixonante de todos.Três anos mais tarde, pude retribuir este presente de valor incomensurável. Na partida entre Vasco e Fluminense pelo Rio-SP 99, fomos juntos ao Maracanã após 30 anos longe do estádio. Seus olhos brilhavam ainda mais e suas lágrimas não demoraram muito a rolar. Pois é, fiz o meu coroa chorar. Mas um choro de emoção, de quem retornava ao local de suas maiores alegrias e lembranças."

Em 2006, o câncer começou a derotá-lo e sua cabeça já não andava tão boa. Porém, nos poucos momentos de lucidez que lhe eram "permitidos", o assunto Vasco não deixava de estar presente. O laço é eterno. Assim como as lembranças. Se nada levamos deste mundo, podemos ter certeza que deixamos muita coisa. E meu avô deixou duas das minhas maiores paixões: o Vasco e o jornalismo. Por isso, este post número 1000 do Blog Boteco do Portuga é em homenagem a você vô. Sei que no cantinho do céu que o senhor estiver, o seu radinho está ligado acompanhando o nosso Vasco.

4 comentários:

  1. Belo texto e Saudações Vascaínas pro seu vô.

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  2. Parabéns pelo texto André! Emocionante!

    Deu até uma ponta de nostalgia de lembrar do Campeonato Carioca nas segundas a noite, de quando o rádio era a única forma de termos notícias completas do nosso time.

    Acho q as novas gerações vão ver o futebol de maneira diferente da nossa...

    Espero q o Boteco do Portuga seja sempre esse ponto de encontro entre vascaínos e quem sabe, ajude a cristalizar a paixão nos mais jovens!

    Parabéns pelo post 1.000!

    Saudações vascaínas!

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  3. Eu não fui desse tempo de rádio a pilha, mas sou vascaíno também graças ao meu avô, que já não se encontra mais presente. Me indentifiquei muito com o texto, quando meu avô estava na cama de um hospital, ruim, ele ainda me perguntava pelo Vasco...

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  4. Parabéns pelo texto, pelo trabalho e por tudo que você conviveu com seu avô.

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